quinta-feira, 23 de agosto de 2007

Cristovão Tezza e seu Filho Eterno: romance do ano?


No último dia 21, no restaurante Beto Batata, em Curitiba, Cristovão Tezza lançou seu novo romance, intitulado O Filho Eterno (Record, 222 p.). Uma pessoa fantástica esse Tezza. Muitos críticos estão jurando que este será o livro do ano. Forte candidato a ganhar o Jabuti 2007.


Miguel Sanches Neto confirma essa prédica dizendo que "com O Filho Eterno, Cristovão Tezza renuncia às preferências veladas e trata de forma direta da própria vida, inscrevendo abertamente a sua história num romance fadado ao sucesso".


O fato é que Tezza é um grande escritor, como já ficou provado em romances como Uma Noite em Curitiba, A Suavidade do Vento, Breve Espaço entre cor e sombra etc. É um autor que foi superando seu próprio estilo ao longo dos anos, de livro para livro. E Cristovão sendo um acadêmico, o interessante é que ele não se tornou um escritor acadêmico, pseudo intelectual. Como já afirmou o próprio escritor, "não tem nada pior que uma tese escrita com características de ficção ou um romance escrito com carcterísticas de tese".


De fato. Esperemos agora mais um romance denso que, semelhante a outros do autor, tende mais para o ensaio ficcional.

segunda-feira, 20 de agosto de 2007

Raul Brandão - Entre a psicose e o Decadentismo


Raul Brandão foi um autor que trilhou caminhos diversos dentro da literatura portuguesa. Começou como contista com o volume Impressões e Paisagens, ainda ligado ao Naturalismo. nessa fase inicial Raul Brandão tinha certo interesse nas temáticas sociais, na vida das pessoas do povo.


As vertentes artísticas e literárias em ascensão no final do século XIX, principalmente o Decadentismo europeu, influenciaram diretamente Raul Brandão, e isso aparece com mais clareza em suas narrativas longas. O melhor de sua obra constitui-se na trilogia A Farsa (1903), Os Pobres (1906) e Húmus (1917), este último é considerado seu melhor romance.


Húmus é um romance que não segue um enredo lógico, linear, apesar da forma de diário. Esse é um paradoxo do texto, porque ao mesmo tempo em que o autor divide seu romance em capítulos e os capítulos em sub-capítulos com data, a narrativa é confusa, desconexa, neurótica, delirante e onírica.


O romance é composto por personagens fantasmagóricos que o leitor não sabe se de fato existem ou não. Os personagens são mais espectros do que pessoas reais. O que deve-se levar mais em consideração em um romance como Húmus é a linguagem. A composição da linguagem nesse texto é riquíssima, fato que faz de Húmus um texto entre o romance e o poema em prosa, ou um romance de prosa poética.


O que fica evidente nesse livro de Raul Brandão é a predominante presença de um sentimento trágico e de que a vida nada significa. Fato que contribui para a confusão mental e linguística do narrador. Nota-se uma atmosfera trágica onde o mundo é composto apenas por gemidos horrendos, por dor e por incapacidade de mudar o presente.


Um ponto relevante na composição de Húmus é a evidente fuga da realidade através do sonho. Em determinada altura da narrativa, o narrador propõe ao seu interlocutor seguir sonhando, e assim encontrar sua redenção, ou voltar à vida real "e seguir o estúpido rebanho" ( p.66).


Essa temática da fuga é rica e constante na obra de Raul Brandão, o que muitas vezes contribui para a narrativa complexa e estertorosa, repleta por seres decadentes oníricos. Mas aí está a força de sua escrita, a importância de sua linguagem psicótica e doentia, que chega ao seu momento de epifania através do nulo, da extinção.