segunda-feira, 20 de agosto de 2007

Raul Brandão - Entre a psicose e o Decadentismo


Raul Brandão foi um autor que trilhou caminhos diversos dentro da literatura portuguesa. Começou como contista com o volume Impressões e Paisagens, ainda ligado ao Naturalismo. nessa fase inicial Raul Brandão tinha certo interesse nas temáticas sociais, na vida das pessoas do povo.


As vertentes artísticas e literárias em ascensão no final do século XIX, principalmente o Decadentismo europeu, influenciaram diretamente Raul Brandão, e isso aparece com mais clareza em suas narrativas longas. O melhor de sua obra constitui-se na trilogia A Farsa (1903), Os Pobres (1906) e Húmus (1917), este último é considerado seu melhor romance.


Húmus é um romance que não segue um enredo lógico, linear, apesar da forma de diário. Esse é um paradoxo do texto, porque ao mesmo tempo em que o autor divide seu romance em capítulos e os capítulos em sub-capítulos com data, a narrativa é confusa, desconexa, neurótica, delirante e onírica.


O romance é composto por personagens fantasmagóricos que o leitor não sabe se de fato existem ou não. Os personagens são mais espectros do que pessoas reais. O que deve-se levar mais em consideração em um romance como Húmus é a linguagem. A composição da linguagem nesse texto é riquíssima, fato que faz de Húmus um texto entre o romance e o poema em prosa, ou um romance de prosa poética.


O que fica evidente nesse livro de Raul Brandão é a predominante presença de um sentimento trágico e de que a vida nada significa. Fato que contribui para a confusão mental e linguística do narrador. Nota-se uma atmosfera trágica onde o mundo é composto apenas por gemidos horrendos, por dor e por incapacidade de mudar o presente.


Um ponto relevante na composição de Húmus é a evidente fuga da realidade através do sonho. Em determinada altura da narrativa, o narrador propõe ao seu interlocutor seguir sonhando, e assim encontrar sua redenção, ou voltar à vida real "e seguir o estúpido rebanho" ( p.66).


Essa temática da fuga é rica e constante na obra de Raul Brandão, o que muitas vezes contribui para a narrativa complexa e estertorosa, repleta por seres decadentes oníricos. Mas aí está a força de sua escrita, a importância de sua linguagem psicótica e doentia, que chega ao seu momento de epifania através do nulo, da extinção.





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