domingo, 27 de dezembro de 2009

ESCRITORES PORTUGUESES CONTEMPORÂNEOS (V) - ANTÓNIO RAMOS ROSA: DO LIRISMO À METAPOESIA



Como eu havia escrito no último artigo da série Escritores Portugueses Contemporâneos, este é o último de cinco artigos. Também como já havia escrito anteriormente, optei por abordar nos dois últimos da série, autores que não fossem romancistas, como o contista Urbano Tavares Rodrigues e António Ramos Rosa, poeta, que é o último escritor português contemporâneo abordado nesta série.

António Ramos Rosa nasceu em Faro, em 1924. Atualmente vive em Lisboa e dedica-se em tempo integral à atividade literária. Publicou seu primeiro livro em 1958, O Grito Claro. Depois vieram Viagem Através de uma Nebulosa (1960), Voz Inicial (1960), Sobre o Rosto da Terra (1961), Ocupação do espaço (1963), Terrear (1964), Estou vivo e escrevo sol (1964), A construção do corpo (1969), Nos seus olhos de silêncio (1970), A Pedra nua (1972), O Ciclo do cavalo (1975), Boca incompleta (1977), A nuvem sobre a página (1978), etc.

Em 2005 Rosa Alice Branco e Rodrigo Petronio organizaram e prefaciaram a antologia Animal Olhar, na qual fizeram um apanhado geral da obra de Ramos Rosa. O interessante neste volume é a forma não cronológica em que os poemas estão dispostos. Os primeiros poemas são de 2005, e os últimos datam de 1958,já posteriores a sua participação na revista Árvore (1952 - 1954).

No início de sua produção poética, António Ramos Rosa voltou-se a um lirismo que mais tarde viria a combater. Data desta época sua produção na Revista Árvore, como diretor e poeta. Há de se levar em consideração a grande difusão de revistas literárias que surgiram em Portugal nos anos 50, como Árvore, Cassiopeia (1956), Távola Redonda (1950 - 1954), Graal (1956 - 1957)etc, e nesse universo em que vários poetas (muitos jovens e estreantes)aderiam a revistas, o lirismo era um dos elementos defendidos por várias revistas, como se o lirismo fosse um retorno à essência real da poesia portuguesa. No ensaio "Lirismo ou haverá outro caminho?", David Mourão-Ferreira discute exatamente essa temática. Cita Ferreira:

Se o Lirismo é, como definiu Paul Valéry, "le développement d'une exclamation" - verificar-se-á que toda a Poesia começa por ser lírica. São líricas as primeiras manifestações poéticas de um povo, de uma geração ou de um indivíduo. (Em cada Poeta se repete, vertiginosamente e de maneira quase estenográfica, o processo geral da história da Poesia...).

Este fragmento do ensaio de David Mourão-Ferreira nos mostra claramente o ideário da revista Távola Redonda (da qual David Mourão-Ferreira foi fundador e diretor) e de várias outras, já citadas no texto, inclusive Árvore, de António Ramos Rosa. Porém o que nos interessou mais em sua poética foi sua fase mais madura, sua produção recente, já dos anos 2000.

Nota-se claramente em sua poesia uma preocupação metafísica que não se via no início de sua obra poética, e que torna, muitas vezes, seus versos muito ambíguos, repletos de elementos antagônicos, como se vê no poema "Caminha para a minha fronte",de 2005. O início do poema já é um questionamento: "poderemos acaso erguer uma torre de sossego/como se estivéssemos no interior do mundo?". O eu-lírico não busca em momento algum com essa indagação inicial as respostas de suas perguntas, pois sabe que as não há, mas seu questionamento é uma mera desculpa para iniciar uma reflexão sobre a desumanidade do ser humano: "nós somos descendentes dos répteis/e por isso amamos o letargo solar entre sombras vegetais". No verso a seguir o poeta entra de fato no que pretende abordar, a inquietação metafísica: "poderíamos assim ouvir o rumor da ausência/como um rosto entre longínquas nascentes/e a pulsação das pedras o obscuro júbilo do fogo". Aqui nos deparamos com um dos principais elementos da poética de António Ramos Rosa,que é a disparidade entre elementos, o antagonismo. Por exemplo, como se ouve o que não há? "Estaríamos na intimidade do olvido", nos dá uma ideia de abandono e de esquecimento, como a própria palavra final nos revela.

Estes fragmentos mostram que a voz do poema busca uma imersão nos mistérios do ser humano, é uma olhada interior. Também é interessante ressaltar a ausência de pontos ou vírgulas nos versos, o que nos mostra claramente um desapego formal com padrões clássicos da poesia. António Ramos Rosa serve-se do significado com excesso, não se importando com experimentalismos, e os símbolos ambíguos que ele constroi são reflexos disso.

No poema "Vazio Pleno", que está no livro Nascente Submersa (2002) Ramos Rosa serve-se de um outro artifício temático muito comum em sua poética, a metapoesia.O poema começa da seguinte forma: "como uma palavra na profundeza do diamante/Ela está sossegada como uma ilha branca/e tão vazia e plena como um cântaro". Há de se levar em consideração aqui a palavra "vazio", pois o poeta diz que a palavra é vazia, e só pode ser vazia de significado, portanto, a forma é o que mais interessa a essa voz no poema.

Alguns versos depois, há uma passagem que remete a outra constante na poética de Ramos Rosa, que é a Terra como símbolo metafísico. "Calada está com a terra como uma chama de água/na tranquila veemência do seu fundo solar". A terra aparece em várias passagens, e em todas elas tem esse significado simbólico do sustento, mas não é o sustento físico, e sim o metafísico. E qual seria esse sustento? Ramos Rosa não pretende apresentar uma tábua de respostas, mas sim apresentar um problema, e é o que ele faz.

Voltando à metapoesia, há um verso que diz: "um sopro de cores irrompe da sua boca redonda/e do umbigo solta-se-lhe uma translúcida serpente".Um "sopro de cores" são os vários sentidos da palavra e a relação entre significante e significado. Como se pode notar, há uma ambivalência nos versos deste poema, pois ao mesmo tempo em que Ramos Rosa se preocupa muito mais com o significado, às vezes aparece de surpresa uma voz e nos surpreende com o significante, como fica claro no seguinte verso: "o ritmo do pulso/mede a lentidão dos montes a imensa torrente azul do céu".

O ato de escrever é levado a um extremo (como já relatado) metafísico, como se uma das chaves para decifrar o que busca (o poeta) só fosse possível através da poesia. "Tão lenta é a existência, tão indolentemente lúcida/que as águas consteladas sob um bosque de nuvens/batem seu estrépito na página do ventre". A existência sem a poesia, ou sem o ato de escrever em geral, é vazia. Para tentar confundir um pouco mais o leitor, ou para deixá-lo à deriva, há mais misturas de elementos de naturezas distintas. No fim tudo faz sentido, tudo se encaixa, mas nenhum mistério é revelado. É mais um dos antagonismos de Ramos Rosa.

No final do poema há esta passagem enigmática: "no branco minarete em que repousa/vê o polvo azul que voa no meio dos pássaros/coberto de raízes e lâminas num torvelinho imóvel/Está no centro do dia , desnuda, repousada/e o seu nome é relâmpago de água que ilumina/as obstinadas, desamparadas palavras soterradas". Há uma alusão, nem tão clara assim, à realização poética, à metapoesia, pois o "branco minarete" aqui é o papel em branco, um dos objetos de trabalho do poeta, e as "raízes e lâminas num torvelinho" sáo as palavras atiradas ao papel a esmo, com fúria, com desejo.

O fazer poético em momento algum é calmo, ele é revolto como o próprio fluxo de pensamentos, como o é a mente do poeta no momento de criação. As palavras são buscadas nos côncavos do ser humano(do poeta), e sua voz clama alto ao mundo para ser ouvida. Mas nem sempre encontra eco no outro, na verdade raramente alcança algum resultado no outro, mas o poeta é obstinado, e mesmo não oferecendo uma tábua de respostas (como já relatado), é no próprio ato de escrever que terá sua resposta final.

POEMAS ANALISADOS NESTE ESTUDO

CAMINHA PARA A MINHA FRONTE

Poderemos acaso erguer uma torre de sossego
como se estivéssemos no interior do mundo? Nós somos descendentes dos répteis
e por isso amamos o letargo solar entre sombras vegetais
Poderíamos assim ouvir o rumor da ausência
como um rosto entre longínquas nascentes
e a pulsação das pedras o obscuro júbilo do fogo
o sorriso cintilante de um regato
Estaríamos na intimidade do olvido
como a pura ignorância de uma sombra lúcida
Seríamos uma erva escrita pela saliva da terra
numa adequação vibrante e sóbria
Veríamos ascender o obscuro em lâmpadas nuas
e toda a espessura seria dúctil e porosa
A identidade encontraria a origem numa flora leve
a hospitalidade de uma terra
nas constelações de argila de basalto e esterco

VAZIO PLENO

Como uma palavra na profundeza do diamante
Ela está sossegada como uma ilha branca
e tào vazia e plena como um cântaro.
Com o ébrio rumor do seu corpo unânime
dir-se-ia uma jarra de topázio ardente
sobre o redondo velame da pedra dos joelhos.
Num bosque de estátuas, entre tanta matéria adormecida,
desenrola os anéis de argila, de âmbar e de ouro
e vagarosamente junta as moedas de madeira lisa
num limbo de água verde. A seus pés uma pedra fendida
e um crânio de cavalo. O ritmo do pulso
mede a lentidão dos montes, a imensa torrente
azul do céu. Calada está com a terra como uma chama de água
na tranquila veemência do seu fundo solar.
A alta confiança, o poderio do ar,
a plena habitação do mundo,
são as linhas de força e graça do seu busto.
Obscenamente pura nas suas grandes fibras
vibrantes, a sua dádiva plena
é a paixão de um caminho errante e todavia imóvel.
Entre incandescentes muros, na espessura rutilante,
guarda inteira nas mãos uma corola de basalto.
Sustenta-se pela grave tensão dos músculos de ébano
e ilumina os desertos de cinza, os espelhos despovoados.
Um sopro de cores irrompe da sua boca redonda
e do umbigo solta-se-lhe uma translúcida serpente.
Os animais marinhos habitam os seus órgãos de verão.
Todo o mar está em festa nos seus flancos azuis
Como um tigre profundo. Tão lenta é a existência,
tão indolentemente lúcida
que as águas consteladas sob um bosque de nuvens
batem seu estrépito na página do ventre.
Tudo se equilibra na balança indolente das suas ancas
e o fundo ascende ao cimo, branquíssimo e doirado,
enquanto do alto tombam os girassóis vermelhos
que lhe inundam as espáduas e os cabelos.
No branco minarete em que repousa
vê o polvo azul que voa no meio dos pássaros
coberto de raízes e lâminas num torvelinho imóvel.
Está no centro do dia,desnuda, repousada,
e o seu nome é um relâmpago de água que ilumina
as obstinadas, desamparadas palavras soterradas.

domingo, 22 de novembro de 2009

"PRESENÇA" E RUPTURA: O BARÃO E O DIALOGISMO DE BRANQUINHO DA FONSECA


Desde o início do século XX a meados dos anos 50 o cenário literário português esteve repleto de revistas de literatura, a começar por Orpheu, revista criada em 1915 por Fernando Pessoa, Mário de Sá-Carneiro e Almada Negreiros. O Orfismo é o primeiro movimento literário considerado moderno, abrindo terreno para artistas (principalmente poetas) de correntes diversas, como o Futurismo e o Decadentismo, ambos já bem difundidos por toda Europa.

Em 1927 surge outro grande movimento literário (talvez um dos mais importantes em Portugal) tendo início também com uma revista, Presença. O Presencismo teve como mestres os poetas de Orpheu, e segundo Massaud Moisés, "não só continuava como renovava o pensamento órfico". Os presencistas defendiam uma literatura livre das "impurezas" acadêmicas e pensavam na estética como fim principal de suas produções. A Presença também tinha um interesse especial pela poesia, tanto pela crítica quanto pela criação artística, (seguindo assim seus mestres de Orpheu), mas muitos presencistas se aventuraram na prosa, principalmente os que mais tarde se tornaram dissidentes.

Como a Presença surgiu em um intervalo entre as duas grandes guerras que devastaram a Europa, muitos escritores neste momento estavam interessados em temáticas sociais, como viria a acontecer com grande entusiasmo no final dos anos 30 com o Neo-Realismo. O que aconteceu foi que muitos presencistas romperam com a revista, tornando-se assim dissidentes, como Miguel Torga, Edmundo de Bettencourt e Branquinho da Fonseca. Esses escritores que romperam com o movimento seguiram caminhos diversos. Miguel Torga, por exemplo, teve uma breve incursão pelo Neo-Realismo e também passou a se interessar por gêneros diferentes (conto e romance). Edmundo de Bettencourt produziu mais poesia, mas não permaneceu presencista e nem tornou-se neo-realista. E Branquinho da Fonseca, outro dissidente, também continuou produzindo poesia mas interessou-se mais pela prosa.

Branquinho da Fonseca depois de ter se afastado da Presença(segundo o próprio autor, julgou que a revista "havia repudiado seus ideais mais primitivos"), manteve-se num interregno, pois não se filiou aos neo-realistas, apesar de ter se interessado, a partir da ruptura, pelo coletivo. Branquinho da Fonseca passa a explorar o aspecto dialógico (Bakhtin) e deixa de se interessar pelo aspecto monológico. E a opção pela prosa é fundamental para a realização deste movimento de ruptura.

O Barão (1942) é a obra fundamental de Branquinho da Fonseca. Nela há vestígios de um presencista, mas também elementos inovadores do dissidente. O Barão é uma novela que em pouco mais de cem páginas apresenta um enredo sem complicações formais aparentes, sem experimentalismos linguísticos. Este livro é o divisor de águas na obra de Branquinho da Fonseca, pois é nesta obra em que todos os novos elementos que estava explorando vêm à tona, como a ambiguidade e o foco narrativo em primeira pessoa.

A narrativa de O Barão começa com o narrador-protagonista, um "inspetor das escolas de instrução primária", relatando uma viagem que fez há muito tempo, e de sua estada no solar de um Barão decadente. O narrador sai de Lisboa com destino à Serra do Barroso, e lá chegando fica hospedado na casa do fidalgo, uma figura excêntrica, despótica, arrogante e curiosa que passa a mostrar, já no início, hábitos nada ortodoxos e estranhos ao narrador.

O Barão bebe vinho o tempo todo e numa atmosfera impregnada de escuridão e de fatos que ficam sem solução, o Inspetor é testemunha de alguns acontecimentos que merecem atenção. Primeiro, quando o narrador chega ao vilarejo e hospeda-se na casa do Barão, ele padece de uma fome terrível que o atormenta, e assim, não presta atenção às histórias do Barão. É interessante ressaltar aqui que a fome do narrador é um fator que exerce influência direta nos acontecimentos, pois a novela é autodiegética, portanto o leitor sabe apenas o que o narrador sabe, e esse é um dos fatos mais importantes e interessantes da narrativa. É a ambiguidade que Nelly Novaes Coelho cita no posfácio da edição brasileira da Editora Verbo:

A verdade é que a uma primeira leitura de contacto (a leitura desprevenida ou "ingênua" para a natural fruição da obra), chegamos ao fim com muitas indagações sem respostas objetivas. Quem é o Inspetor? Será realmente apenas o modesto funcionário público que nos conta uma aventura? O homem sem sonhos e sem possibilidades de os ter que sonha uma vida de ociosidades sedentárias? O burocrata docilmente moldado à engrenagem rotineira, "farrapo nas mãos de toda gente"? Quem é realmente o Barão? Será apenas o fidalgo decadente e grosseiro que inexplicavelmente nos atrai?

Toda a narrativa do Inspetor é feita desta forma. Se o narrador fica sem saber ou ver determinado acontecimento, o leitor também fica. Daí as considerações da Professora Nelly Novaes Coelho sobre a ambiguidade de Branquinho da Fonseca. Ao mesmo tempo em que o leitor se depara com um texto linear, estanque e com uma linguagem direta, também se depara com todos esses símbolos presentes na narrativa, como a relação maniqueísta entre o Barão e o Inspetor; aquele representando uma fidalguia decadente e vazia; este representando uma classe média ingênua e alienada, oprimida pelo empreguismo (não carreira, mas empreguismo mesmo).

Um momento muito interessante da narrativa é quando depois de já ter devidamente jantado e saciado sua fome, o Inspetor é levado pelo Barão para ver o espetáculo da Tuna. A atmosfera de mistério durante o evento é muito interessante, e durante as músicas e as canções outro elemento exerce um papel fundamental na narrativa até o fim: a bebida. Nessa aparição da Tuna o Inspetor já havia bebido muito vinho e licor e não seguia mais uma linha lógica de raciocínio, e sua embriaguez se reflete na escrita. Durante a apresentação da Tuna numa das salas do casarão do Barão, o Inspetor, o Barão e a criada banham-se em vinho, dançam ao som da música inebriante e uma atmosfera orgiástica assume os andamentos da narrativa.

Depois que a Tuna encerra suas atividades, o Barão e o Inspetor saem pelo bosque e caminham entre as árvores numa noite sem lua, completamente escura. É nesse momento que o Barão ouve passos e afirma que são de pessoas. O Inspetor não lhe dá ouvidos, mas depois de alguns minutos de caminhada, já acostumado com a escuridão, também passa a ouvir os passos e outros barulhos suspeitos. O autor dá a entender aqui que o Barão estava sendo perseguido pelos criados e estaria prestes a se tornar vítima de um motim. Mas a tensão logo é quebrada e o leitor percebe que aquilo tudo foi criado pelas mentes alcoolizadas do Inspetor e do Barão.

O Barão tinha a intenção de levar à "Bela Adormecida" uma rosa, e depois que o Inspetor e o Barão se perdem na escuridão, só voltam a se encontrar no final da narrativa, quando o Barão ferido e aparentemente moribundo diz ao Inspetor:

Mas ficou...na janela...

O Barão se refere à flor que deixara na janela da "Bela Adormecida", que em momento algum do texto é revelada. Pode ser a criada, pode ser alguma mulher qualquer, não sabemos, e é esse mistério que dá tanto valor ao livro. A ambiguidade apontada por Nelly Novaes Coelho é de extrema importância para a compreensão do texto. Nada do que é narrado pelo Inspetor tem apenas o significado do que parece ter. O sentido e o significado das palavras na narrativa vão muito além de sua forma.

Branquinho da Fonseca realiza em O Barão o melhor de sua produção literária. É um livro síntese que abrange elementos anteriores e posteriores de sua ruptura com a Presença, apesar de ficar evidente que seguiu um caminho diverso do que fazia antes. A começar pelo gênero que escolhe, a novela (prosa), fato que já difere muito de sua produção presencista. A preocupação com o "outro" é assumida, mesmo não sendo tão clara e nem se aproximando do Neo-Realismo, mas fica claro que está presente no discurso assumido pelo narrador e também por Branquinho da Fonseca. A relação lírica com a Presença foi substituida por uma epicidade que só seria possível, segundo o próprio autor, na prosa. E O Barão é o melhor exemplo disso.

sexta-feira, 13 de novembro de 2009

MIGUEL SOUZA TAVARES: O TEMPO E O DESERTO


A viagem foi tema recorrente para muitos escritores portugueses, a começar pelos cronistas, durante o Humanismo. Fernão Lopes, Gomes Eanes de Azurana, Rui de Pina, D. Duarte. No Classicismo o maior exemplo é Luís de Camões, com o monumental Os Lusíadas. Nos séculos que se seguiram muitos outros autores produziram textos com essa temática, também muitos poetas, como Almeida Garret, com Viagens à minha Terra, e Padre Manuel Bernardes.

No século XX Miguel Torga (Vindima), Fernando Namora (Retalhos da vida de um médico), José Saramago (Memorial do Convento), Antonio Lobo Antunes (Os cus de Judas) são alguns dos nomes de escritores portugueses que publicaram obras que de alguma maneira retrataram viagens, seja no sentido mítico ou literal da palavra. A viagem pode ser retratada de muitas formas e com fins diversos, como temática social, êxodo, busca ontológica, enfim, o painel é vasto.

Na literatura portuguesa atual há um nome novo produzindo boa literatura e, em seu mais recente trabalho, utilizou o tema da viagem para desenvolver sua narrativa, trata-se de Miguel Souza Tavares, que recém publicou o romance No teu Deserto (2009). Souza Tavares nasceu no Porto em 1952. Formou-se em Direito, mas logo abandonou a advocacia para dedicar-se ao jornalismo e mais recentemente à literatura. Publicou os livros de reportagens e crônicas Sahara - A República da areia (1985) e Sul (1998). Estreou na ficção com Equador (2003). Depois vieram Rio das Flores (2007) e No teu Deserto.

No Teu Deserto é a narrativa em primeira pessoa de um jornalista que, há vinte anos, realizou uma viagem ao Sahara a trabalho com uma equipe de aventureiros e de Cláudia, uma jovem quinze anos mais nova e incrivelmente bela. Sua narrativa, um tanto amarga e lírica, relata a convivência dos dois durante quarenta dias entre o deserto, cidades desconhecidas e as horas passadas no jipe. Muito do que é narrado parece ser muito mais sugerido do que ocorrido de fato, como por exemplo, as noites que os dois passaram, em meio a tormentas, juntos dentro da barraca. Em momento algum relações sexuais são descritas, mas fica claro que as tiveram.

E eu fui e encostei-me a ti, à porta da tenda. O mundo inteiro estava em revolta. O ar não era escuro, era cinzento-pesado, o ruído do vento era apocalíptico, parecia uma besta cega à nossa procura para nos trucidar. Tudo o que horas antes era paz agora era caos, desordem, violência absurda. Puxaste-me a cabeça para o teu ombro e eu encostei-me a ti. Passaste-me o braço pelas costas e não sei quanto tempo fiquei assim até adormecer de exaustão (p. 93).

Essa é uma das várias passagens em que os acontecimentos narrados são mais sugeridos do que ocorridos de fato, assim como as passagens que são narradas por Cláudia. Essas passagens não ficam claras e merecem algumas considerações. Primeiro, logo no início de sua narrativa, o jornalista (que não é nomeado) assume estar contando uma história, estar escrevendo um livro, e que no final, Cláudia morre.

(No fim tu morres. No fim do livro tu morres. Assim mesmo, como se morre nos romances: sem aviso, sem razão, a benefício apenas da história que se quis contar. Assim, tu morres e eu conto. E ficamos de contas saldadas.) (p. 9)

Segundo, assim como o narrador pratica a autodiegese e assume estar escrevendo um livro, as poucas passagens que são narradas por Cláudia podem ter sido criação do narrador, que está vinte anos distante dos acontecimentos descritos, melancólico e austero. Exatamente pelo fato de ter vivenciado os fatos que descreve, o narrador não podendo lembrar de tudo como gostaria, assume claramente a posição de ficcionista e tende a inventar. Mesmo que afirme o contrário.

A verdade é que, agora que me sento para te escrever, reparo - mas sem nenhum espanto nem estranheza - que não preciso de inventar nada: lembro-me de tudo, exactamente tudo, hora por hora, quase cada olhar nosso, cada gesto, cada sorriso, cada amuo. Sim, às vezes acontece-me esta coisa curiosa, quando olho para trás através dos anos: lembrar-me de todos os detalhes - até daqueles que na altura achei que não teriam nenhuma importância nem significado - e todavia ser incapaz de situar o tempo exacto em que vivi as coisas. Como se as continuasse para sempre a viver, ou como se nunca as tivesse vivido (p. 9 e p. 10).

Nota-se que o narrador ao mesmo tempo em que assume o discurso do lembrar, também assume a posição de criador, pois no final do fragmento acima ele mesmo tem dúvida do que pode ter sido inventado ou não. Isso vem de encontro àquela ideia dos fragmentos "narrados" por Cláudia, pois já que ela havia morrido, ela não poderia ter narrado tais acontecimentos. E mesmo que pudesse, o livro que está sendo escrito (o livro dentro do livro, do protagonista, não o de Miguel Souza Tavares), desta maneira sofreria uma interrupção que não faria sentido algum no corpo da escrita. Neste caso deve ser levada em consideração a epígrafe, que diz:

Para a Cláudia
lá em cima,
numa estrela sobre o Sahara

É óbvio que esta epígrafe é do livro do narrador anônimo e não de Souza Tavares. Há nesta obra a presença clara dos conceitos de Umberto Eco sobre autor-empírico e autor-modelo. Miguel Souza Tavares consegue com essa movimentação do foco narrativo e com a tênue linha entre ocorrências e sugestões, uma narrativa lírica e metafórica, com símbolos muito bem construidos. Como é o caso do título.

O deserto que é descrito no romance claramente faz alusão à solidão, mas não se trata apenas de um conceito simplista e clichê. A relação do protagonista com Cláudia dura os quarenta dias que estiveram no deserto, depois se veem uma ou duas vezes num quarto de hospital (Cláudia estava doente, não sabe-se exatamente de qual doença) e desta forma cada um segue um caminho diferente. A solidão à qual o deserto faz alusão é a solidão da vida moderna, do indivíduo moderno, pois o narrador seguiu seus trabalhos mundo afora depois que retornaram a Lisboa e Cláudia seguiu sua vida um tanto vazia, mas ambos ainda sentiam falta daquela breve passagem pelo deserto. E também de sua presença insondável.

A imersão em uma vida atribulada tipicamente moderna foi tão intensa no narrador que ele nem soube quando Claudia morreu, soube por um amigo muito tempo depois. E esta perda é sentida profundamente, mesmo que ambos tenham seguido caminhos opostos, e o interessante é que Souza Tavares não elabora motivos para explicar porque eles não continuaram juntos. Os fatos descritos simplesmente aconteceram, sem explicação, sem salvação e sem volta. O narrador perdeu-se, para sempre, no deserto que é a presença de Cláudia e também a sua ausência, a sua nulidade, pois o deserto, ao mesmo tempo que simboliza os dias que passaram juntos, também simboliza o vazio, a dor, a solidão e o tempo que passou.




sexta-feira, 30 de outubro de 2009

FERREIRA DE CASTRO E A GÊNESE DO NEO-REALISMO


O escritor e crítico literário Alexandre Pinheiro Torres (1923 - 1999) publicou em 1977 o livro O movimento neo-realista em Portugal na sua primeira fase, no qual discorre sobre as principais influências diretas do movimento, entre elas, alguns nordestinos brasileiros como Jorge Amado, José Lins do Rego, Raquel de Queiróz. Há também a grande influência dos norte americanos da chamada Geração Perdida, John Steinbeck, Willian Faulkner, Hemingway, Gertrude Stein e John dos Passos.

É claro que os neo-realistas também foram influenciados por seus conterrâneos portugueses, e um autor em especial foi quem deu início, sem a intenção de causar a revolução que o movimento causou, ao Neo Realismo, trata-se de Ferreira de Castro, autor do romance A Selva. Ferreira de Castro nasceu em Salgueiros, distrito de Aveiro, em 1898. Aos doze anos de idade emigra para Belém do Pará, de onde segue para o interior da Amazônia para trabalhar como seringueiro. Publicou seu primeiro livro em 1916, Criminoso por Ambição, em Belém, após retornar do seringal no qual passou quatro anos. Depois publicou os romances Carne Faminta (1922), O Êxito Fácil (1923), Sangue Negro (1923), A Morte Redimida (1925), etc., livros que posteriormente o autor veio a renegar.

Sua fase madura tem início quando publica o romance Emigrantes (1928), mas é com A Selva (1930) que alcança certo prestígio. Nesse romance Ferreira de Castro narra as aventuras e peripécias de Alberto, um jovem português que, exilado, vem para o Brasil, mais precisamente para Belém do Pará. Sem emprego e vivendo à custa de um tio, Alberto vive sem anseio de melhorar sua atual situação e de almejar algo maior para seu futuro, quando seu tio Macedo consegue para ele um emprego como seringueiro, no interior da Amazônia, num seringal chamado Paraíso. Sem condições de escolher ou negar nada, Alberto resigna-se e parte na odisséia rumo ao seringal distante, a bordo do "Justo Chermont", uma espécie de vapor que é dividido em classes, e é já na ida para o seringal que as diferenças entre ricos e pobres evidenciam-se.

Alberto, que não estava acostumado ao sofrimento, à pobreza e ao descaso dos mais fortes com os oprimidos, sofre um choque cultural que vai acompanhá-lo até o final da narrativa. É na classe dos trabalhadores em que Alberto é acomodado e lá passa a conviver com o tipo de pessoa que no passado ignorava completamente, ou por pura alienação ou por preconceito. Da outra classe do "Justo Chermont", onde ficavam os donos de seringais, comerciantes e outros donos de terras, como fazendeiros, Alberto ouve o som de música, de risadas, conversas e o som dos talheres batendo nos pratos, o que deixa bem claro que agora, ele pertencia à classe de baixo.

Chegando ao destino final, no seringal Paraíso, às margens do Rio Madeira, Alberto se familiariza com os outros seringueiros e passa a conviver em cumplicidade com esses seres marginalizados, que por serem explorados pelo patrão e dono do seringal, Juca Tristão, são impossibilitados de abandonar a vida que levam. Logo faz amizade com Firmino, um mulato que o ajuda e o auxilia logo nos primeiros dias a tirar o leite das árvores, e aí nasce uma amizade que durará até o fim de sua tarefa como seringueiro. Firmino é o estereótipo clássico do oprimido, pois por ser duramente explorado pelo senhor das terras (Juca Tristão), não pode retornar à terra de origem, o Maranhão.

Todos os empregados inferiores, seringueiros e capatazes, eram obrigados a comprar os mantimentos básicos para sobreviver na própria venda de seu Juca Tristão, e como não recebiam o pagamento já de início, trabalhavam praticamente de graça, pois trabalhavam apenas para saldar a dívida da venda, o que nunca acontecia porque os trabalhadores precisavam se alimentar, e assim continuavam consumindo e por consequência a dívida ia aumentando. Constantemente os seringueiros eram enganados em relação ao preço da borracha, e assim o patrão saia sempre ganhando e tinha um lucro de mais de 100%.

Levando em consideração a forma que Ferreira de Castro narra a história de Alberto, pode-se dizer que a narrativa é tão linear que torna-se até banal. Um enredo sem muitos acontecimentos, muita descrição da selva (o que torna-se maçante em determinados pontos) mas é uma obra madura, apresenta uma narrativa consistente de um autor sóbrio. Como foi muito comum nos escritores neo-realistas que vieram após o lançamento de A Selva (a partir do final dos anos 30 e início dos 40), Ferreira de Castro opta pelo foco narrativo em terceira pessoa, mostrando desta forma um interesse maior pelo coletivo. Mesmo que narre a história de Alberto, evidencia-se um claro interesse pela causa dos seringueiros. Alberto é a figura que representa toda essa classe de oprimidos que, sendo o único trabalhador que sabia ler e escrever, é o único que tem o direito de pensar, raciocinar, imaginar, enquanto os outros se entregam à bebida.

Um fator importante na narrativa é a presença cruel, avassaladora e imponente da selva. Mesmo sendo ainda uma obra neo-realista em embrião, A Selva apresenta uma das grandes marcas do Neo-Realismo, a importância do espaço na narrativa, como se fosse personagem integrante dos acontecimentos, como mostra o fragmento a seguir:

A ameaça andava no ar que se respirava, na terra que se pisava, na água que se bebia, porque ali somente a selva tinha vontade e imperava despoticamente. Os homens eram títeres manejados por aquela força oculta, que eles julgavam, ilusoriamente, ter vencido com a sua atividade, o seu sacrifício e a sua ambição (p. 170 e p. 171).

Os teóricos chamam esse mecanismo de narrativa atmosférica, e o fragmento acima mostra claramente que A Selva trata-se de uma narrativa atmosférica. A selva descrita no romance também serve como um microcosmo para o que acontecia no mundo naquele momento (1930). O mundo vivia um hiato entre duas guerras mundiais, em Portugal o fascismo estava em ascensão (a ditadura de Salazar) e o abuso do poder era praticado em boa parte do mundo, e tudo isso é retratado no seringal Paraíso.

Alberto tem consciência das injustiças ocorridas no seringal, mas não tem força para combatê-las. Como é o único letrado no meio da selva, encontra-se isolado em todos os sentidos. Mais uma vez as relações de poder se fazem evidentes quando Alberto é promovido de seringueiro a guarda-livros, e dessa forma seu tratamento é diferenciado dos seringueiros (que continuam seringueiros). Tudo termina quando todo o local de habitação, tanto dos empregados quanto de Juca Tristão, é consumido pelo fogo (um incêndio criminoso).

A Selva mostra claramente ser uma obra neo-realista ainda embrionária também porque seu protagonista, diferente de tantos outros do Neo-Realismo, não torna-se um mártir. Alberto pensa, divaga, tem opinião, mas não se revolta contra o sistema que tanto o oprimiu e continua oprimindo severamente seus colegas seringueiros. Mas a ideia está lá, está nas ações de Alberto que se impondo ideologicamente ou não contra as arbitrariedades do sistema, tornou-se o protagonista precursor do Neo-Realismo.




quarta-feira, 14 de outubro de 2009

FERNANDO NAMORA: NEO-REALISTA INDEPENDENTE E SUI GENERIS


Na história da literatura houve grandes escritores que foram médicos. No Brasil um dos expoentes máximos da literatura nacional, João Guimarães Rosa, era médico, e em suas atribuições de médico percorreu o sertão mineiro em busca de fatos, histórias e pessoas que acabaram por contribuir na composição de Grande Sertão: veredas. Outro grande escritor brasileiro, ainda vivo, também foi médico, especialista em saúde pública, trata-se do gaúcho Moacyr Scliar, que durante vários anos de sua vida se dedicou à profissão de médico e paralelamente a de escritor, até se aposentar e se dedicar integralmente à literatura.

Em Portugal também há vários exemplos de médicos escritores, ou escritores médicos, como Miguel Torga, António Lobo Antunes e Fernando Namora. Todos eles foram, de fato, grandes escritores e sempre tiveram grande admiração da crítica e de um bom número de leitores. Fernando Namora, que publicou suas experiências como médico no livro Retalhos da Vida de um Médico (1949), foi um escritor versátil, prolífico, praticante de vários gêneros como a poesia, conto, romance, crônica e outras narrativas.

Fernando Namora nasceu em Condeixa, distrito de Coimbra, em 1919. Formou-se em Medicina pela Universidade de Coimbra e estreou na literatura como poeta em 1938 com o livro Relevos. Suas principais obras são Terra (poesia, 1940), As Frias Madrugadas (poesia, 1959), Retalhos da vida de um Médico (contos, duas séries, 1949 e 1963), Cidade Solitária (contos, 1959), Fogo na Noite Escura (romance, 1943), Casa da Malta (romance, 1945), Minas de San Francisco (romance, 1946), A Noite e a Madrugada (romance, 1950), O Trigo e o Joio (romance, 1954), O Homem Disfarçado (romance, 1957), Domingo à Tarde (romance, 1961).

Mesmo Fernando Namora tendo produzido mais narrativas longas (romances e novelas) foi também um grande contista, e o livro Resposta a Matilde (1980) é um belo exemplo disso. Durante muito tempo Fernando Namora esteve ligado ao movimento neo-realista, porém sempre manteve-se independente, fato que permitiu com que o escritor transitasse o núcleo de suas temáticas e seu estilo.

Neste artigo abordarei o primeiro texto que compõe o livro Resposta a Matilde, Era um desconhecido, que apesar de fazer parte de um volume de contos, está mais próximo de uma novela. Em Era um Desconhecido, melhor narrativa do livro e talvez um dos melhores escritos de toda carreira de Namora, é narrada a história de um triângulo amoroso que não se realiza. Tudo começa quando Arnaldo, um professor particular de matemática, ou explicador, passa a frequentar um discreto café em um espaço entre duas aulas. Bom observador, claro, com a ajuda do narrador, Arnaldo passa a conhecer os outros frequentadores do local que são sempre os mesmos, e assim Fernando Namora parece que vai tecendo uma sutil crítica ao marasmo da vida da classe média lisboeta.

Depois de alguns capítulos tecendo considerações sobre o protagonista e constantemente se dirigindo ao leitor (ao estilo de Sterne e Machado de Assis), o narrador definitivamente faz com que destinos diversos se cruzem, quando Arnaldo e Manuela passam a trocar olhares, e é a partir desse momento que a trama começa de fato. Em uma breve saida do café, Manuela vai atrás de Arnaldo e rapidamente trocam números de telefone e, para a surpresa de Arnaldo, Manuela não parece se importar com a constante presença do marido. O que vem a acontecer em seguida já encerra o mistério, pois o fato de Manuela se interessar por Arnaldo tão abertamente era um plano do próprio marido, Daniel.

O plano era basicamente a total liberdade de Manuela para ter relações sexuais esporádicas com o homem que ambos, Manuela e Daniel, escolhessem, pois Daniel se sentia na obrigação de permitir tal relação, pois havia traído Manuela no passado e a relação da mulher com o professor seria uma espécie de indenização. O escolhido foi Arnaldo. Seu espanto foi tanto que a um primeiro plano sua reação foi negar categoricamente a proposta que recebera, pois a relação que teria com Manuela teria o aval do marido, mas teria que acontecer em sua casa, talvez às vistas de Daniel. Arnaldo sente-se atraido por Manuela, mas jamais concordaria em iniciar um relacionamento daqueles na própria casa do marido da amante, por isso aluga um quarto de uma senhora num bairro mais afastado, e concorda com o plano apenas se ambos pudessem se encontrar neste quarto. No início Daniel reluta mas acaba aceitando. O desfecho é trágico, pois num momento (mais um) de irracionalidade, Daniel não suportando a traição da mulher, a qual ele próprio havia combinado, comete suicídio nos arredores da casa e a narrativa se encerra aí.

Há de se levar em consideração nesse texto as formas como o autor conduz toda a narrativa. O narrador assume um claro tom de ironia diante do leitor, pois a todo o momento, principalmente nos três primeiros capítulos, vai construindo a narrativa aos poucos, como se precisasse da ajuda de quem o lê. Em vários momentos o narrador assume não saber qual direção seguir, e conforme vai contando (escrevendo) vai criando nomes, posições sociais e é dessa forma que o enredo vai se desenvolvendo até alcançar certa consistência.

Este espécime, que eu encontro no café pela quinta ou sexta vez, sempre à mesma hora, usa colete (outro sinal característico) e só deixa o último botão desabotoado, naturalmente coincidente com o sítio onde o ventre começa a expandir-se. Vida sedentária, está visto. As horas livres, que nem serão muitas, passa-as o nosso herói aqui, no Café Estrela, uma ou outra tarde no cinema (...) e, aos domingos, arejado de brisas e odores, a conduzir briosamente o automóvel até um restaurante dos arredores, acompanhado da família (se é que a tem, por hora vamos admitir que sim)... (p.12)

Nota-se claramente neste fragmento a indecisão do narrador por qual caminho seguir (tinha ou não tinha família o protagonista?) e as incertezas de sua narrativa se refletem nos acontecimentos que ele impõe aos personagens. A metalinguagem é outra faceta claramente assumida aqui, e o narrador, que ao mesmo tempo em que se insere no espaço físico da narrativa, portanto seria uma personagem comum como outra qualquer, também é o narrador onisciente e onipresente que narra todos os pormenores acontecidos entre quatro paredes.

O que permite toda essa manobra de confluência verbal e temática são três elementos básicos: o primeiro é o tom jocoso adotado pelo narrador ao contar a história, que parece claramente ser as divagações de um escritor ao produzir um texto literário transpostas no papel. E a intenção de Fernando Namora provavelmente deve ter sido esta. Outro elemento que é fundamental para a compreensão do texto é uma espécie de epígrafe escrita pelo autor, Fernando Namora (pois há aqui as presenças de um autor-modelo e de um autor-empírico):

Um dia Matilde disse-me:

- Enfadam-me as tuas estórias. Todas poderiam ter acontecido.
- E isso é um defeito?, repliquei, um tanto amuado.
- Para mim, é. Prefiro coisas inverossímeis, incomuns.
-Mas as coisas inverossímeis onde acontecem é na vida. A literatura tem uma lógica, a vida tem outra.
- Pois experimenta misturá-las. Talvez te dê o mesmo resultado de quando se cruzam as linhas telefônicas e nos pomos a escutar uma conversa alheia, que nos revela insolitamente uma outra gente e um outro mundo. E, no entanto, esse mundo é o nosso, essa gente somos nós.
Cismei um pedaço naquilo e, por fim, anuí:
- Vou tentar. Depois telefono-te.
Meses passados, disquei o número de Matilde.

O terceiro elemento que permite toda essa manobra narrativa é o paratexto, ou seja, trata-se de um termo adotado por Umberto Eco em Os seis passeios pelos bosques da ficção (1994), que é uma informação adicional da obra que faz referência à própria obra, como a palavra "romance" escrita na capa de um romance, ou "conto", "crônica", "poesia", etc. Em Resposta a Matilde o paratexto indica a palavra "divertimento", já dando uma prévia da ironia com a qual o leitor irá se deparar.

Fernando Namora mostrou ser um escritor que em toda sua vasta obra conseguiu se inovar, se reinventar. Os outros contos que compõem Resposta a Matilde também são dignos do grande escritor Fernando Namora, como O Parente da Austrália, Dois ovos ao Fim da Tarde e O Rio. Mas em termos de estilo, de escrita e de temática nenhum deles supera Era um desconhecido, que pode ser lido como um conto mais longo, ou talvez uma novela. Era um Desconhecido apresenta uma estrutura de novela, de romance (a comprovar as divisões em capítulos), porém o desfecho, o clímax é tipicamente de um conto. O final que não acaba, um aparente embaralhamento formal que leva a narrativa a uma atmosfera trágica e, ao que tudo indica, nonsense.

segunda-feira, 28 de setembro de 2009

ESCRITORES PORTUGUESES CONTEMPORÂNEOS (IV) - URBANO TAVARES RODRIGUES: DIAS LAMACENTOS E O SUICÍDIO MÍSTICO DO HOMEM MODERNO


Seguindo a série Escritores Portugueses Contemporâneos, este é o quarto entre cinco artigos. Nos três primeiros abordei narrativas de José Saramago, Almeida Faria e Augusto Abelaira, mais especificamente a produção romanesca desses autores. Achei conveniente, também por sugestão de alguns leitores, abordar nos dois últimos artigos que restam da série gêneros diferentes, como o conto e a poesia.

O conto português do século XX foi muito bem representado por grandes nomes como Miguel Torga, Manuel da Fonseca, Vergílio Ferreira, Lídia Jorge, Urbano Tavares Rodrigues e outros. Mesmo sendo um gênero que permaneceu à margem durante muito tempo, muitos desses autores foram verdadeiros mestres do gênero. Um bom exemplo de um grande mestre das narrativas curtas é Urbano Tavares Rodrigues.

Nascido em Lisboa em 1923, Tavares Rodrigues formou-se em Filologia Românica pela Universidade de Lisboa, na qual lecionou até aposentar-se. Tem vasta obra publicada em Portugal e em toda Europa. Autor de romances e contos, livros de viagens e crônicas, ensaio e crítica, foi no conto que obteve maior êxito estilístico. Entre suas obras mais significativas estão A Noite Roxa (1956), Bastardos do Sol (1959) e Dias Lamacentos (1965), volume de contos e duas micro-novelas.

Dias Lamacentos é composto por 4 contos e por duas micro-novelas, sendo que a última, Prima Matéria, foi incluida no volume, juntamente com o conto A história de uma mulher, na terceira edição, em 1988. Segundo o próprio autor, concernente ao título do livro, "Dias Lamacentos, título intencional que, como outros meus, foi metáfora do Fascismo, ao mesmo que, em primeira leitura, cobria semanticamente o conto epônimo". A atmosfera dos contos presentes neste livro, assim como o título, também faz menção indireta ao fascismo e ao período ditatorial em Portugal. Em um primeiro momento as narrativas seguem, mesmo que ainda em embrião, o existencialismo francês de Sartre e Malraux. Já em um segundo momento, a militância de Urbano Tavares Rodrigues se faz muito clara, fato que acaba por prejudicar sua ficção em determinados aspectos. Como acontece na micro-novela que encerra o livro, Prima Matéria.

Os primeiros contos que fizeram parte da primeira e segunda edições, são verdadeiras obras-primas. O conto que abre o volume é Terra Vermelha, uma narrativa que não apresenta grandes novidades formais, mas a sua atmosfera obscura e sua fluência verbal fazem do conto uma bela prévia do que virá nos contos a seguir. A segunda narrativa, que é mais uma micro-novela do que um conto, Figuras Jacentes, está entre as melhores do livro. É a história de Dinis e Mercês, amantes que envoltos numa relação tumultuada, se veem às voltas num intrincado painel amoroso que desde seu início parece ser conduzido a um final trágico.

É interessante ressaltar que nessa micro-novela Urbano Tavares Rodrigues explora bem o foco narrativo, alternando seus narradores conforme introduz na narrativa capítulos. Dessa forma pode-se perceber a visão de cada narrador sem a intromissão de uma voz onisciente. Dinis é um homem amargurado por ser deficiente físico e por sua situação ser uma constante ameaça, ao menos para ele próprio, às suas intenções de casar-se com Mercês. Seu drama fica mais claro quando Dinis descobre que Mercês passa a se encontrar com um professor de ginástica. Esse é um grande símbolo da narrativa, pois o professor de ginástica é tudo aquilo que Dinis não podia ser, ou seja, um "homem completo" que poderia dar à Mercês a vida que desejava. Pode ser uma metáfora sobre o maniqueísmo que estava tão presente na Europa durante os tempos de guerra, do fascismo. Ao passo em que um é provido do mais puro amor e de "consciência social" (Dinis), o outro (professor de ginástica) é fútil e quer apenas uma situação cômoda, fazendo uma alusão à classe média e à burguesia, ao fascismo e aos movimentos de resistência.

Dessa forma, percebendo que perderia Mercês, Dinis, num momento alucinado, propõe que ambos morram juntos, envenenados. Aqui está uma belíssima construção narrativa de Tavares Rodrigues, pois em um capítulo ele descreve a proposta alucinada de Dinis e a aceitação de Mercês, ou seja, ela aceita se matar junto com Dinis, mas ele volta atrás e apenas assiste a amante morrer em agonia. Mas no capítulo que segue, Dinis afirma ter sido aquilo uma alucinação. E aí vem o segundo momento, em que Dinis, sabendo que Mercês não o amava, se resigna a viver na solidão, "permitindo"a Mercês viver com o professor de ginástica. E por fim, há uma terceira versão do que pode ter acontecido, que é o abandono de Mercês, ela não aparece, o que deixa Dinis mais deprimido, pois preferia que ela tivesse sido sincera, e dito diretamente que não aceitaria tal proposta. Essa terceira versão já se evidencia no início do último capítulo.

É verdade que não vieste. Como havia de comparecer a tão absurda intimação? , a tão repelente convite (p. 63).

E a micro-novela se encerra numa atmosfera onírica, nonsense, se enquadrando mais ao já referido existencialismo (mesmo que em embrião) sartreano. O conto que vem na sequência, Dias Lamacentos, que dá título ao livro, é a melhor de todas as narrativas do volume. Narra uma breve passagem que mostra o diálogo entre dois amigos, Zeca e Dario, que esperam numa construção um homem que é ligado a algum ministério e que lhes conseguirá um alvará para o futuro negócio que abrirão nesse prédio em obras.

Entre trabalhadores mal humorados e insatisfeitos, betoneiras, tijolos, cimentos e muita sujeira, os dois amigos tecem considerações sobre diversos assuntos. Vida, morte, filosofia de Kierkegaard e dessa maneira Tavares Rodrigues vai mostrando as diferenças entre as classes, sem cair no engajamento marxista, na literatura panfletária, e explora uma espécie de existencialismo, fugindo do foco narrativo em terceira pessoa em que, com um narrador onisciente, narra a conversa entre os dois empresários, passa a narrar em primeira pessoa as angústias e aflições de um trabalhador anônimo. As interrupções do trabalhador anônimo interfere no diálogo linear de Zeca e Dario algumas vezes. Todo esse ambiente da construção é invadido por uma escuridão que dá um clima lúgubre à narrativa.

O conto termina quando o foco narrativo volta à terceira pessoa e Zeca, que via apenas as sombras do trabalhador anônimo na parede, como se ele de fato não existisse, como as sombras do mito da caverna de Platão, vê o anônimo cair do prédio. Um fato interessante a se considerar é o mistério que envolve os verdadeiros motivos da queda do trabalhador. Ele caiu como uma vítima de acidente de trabalho ou se jogou. Sutilmente o autor deixa transparecer o suicídio, mas não revela-se de fato o verdadeiro motivo da tragédia. É mais uma vez que Tavares Rodrigues encerra uma narrativa tragicamente neste livro, construindo assim a melhor narrativa do volume.

Urbano Tavares Rodrigues está entre os grandes escritores portugueses contemporâneos, e com certeza um dos maiores contistas portugueses do século XX. Mesmo Tavares Rodrigues tendo trilhado o engajamento marxista em muitas obras suas, não se tornou um autor panfletário. Dias Lamacentos é um exemplo disso, um exemplo da competência literária de um autor que sabe discernir entre política e obra de arte, sem deixar a ideologia se sobressair à literatura.

quinta-feira, 17 de setembro de 2009

ESCRITORES PORTUGUESES CONTEMPORÂNEOS (III) - AUGUSTO ABELAIRA : A RUPTURA DO SUJEITO


Muitos escritores portugueses durante o periodo repressor de Salazar (1933 - 1974) publicaram obras que abertamente denunciavam o regime ditatorial, principalmente durante o periodo neo-realista. Naturalmente que muitos desses autores "engajados" praticavam a chamada literatura panfletária, mas também muitos destes mesmos autores não se limitavam à crítica política e ideológica. Ferreira de Castro, Alves Redol, Miguel Torga, Fernando Namora, Manuel da Fonseca foram escritores que no início de suas trajetórias literárias se preocuparam com temáticas sociais, mas suas obras, de modo geral, evoluiram a um patamar de grande prestígio e de qualidade formal dentro da literatura portuguesa.

Vários destes autores que se vincularam ao neo-realismo nos anos 40, evoluiram seus universos ficcionais típicos da época, como o foco narrativo em terceira para a primeira pessoa, deixando a narrativa mais objetiva, uma preocupação maior com o coletivo do que com o individual, ações que transcorriam em ambientes rurais, o retrato dos dramas de trabalhadores num Alentejo basicamente feudal, para temas mais centrados em dramas pessoais do indivíduo. A crítica social depois de certo ponto ficou um tanto estereotipada e maçante, e muitos autores migraram do neo-realismo para correntes diversas, e em muitos casos, alguns não se vincularam à tendência alguma e permaneceram "independentes", como Vergílio Ferreira, José Rodrigues Miguéis e Augusto Abelaira. E é sobre este último que falaremos a seguir.

Augusto Abelaira (1926 - 2003) português de Ançã, pequena vila situada entre Coimbra e Cantanhede, região central de Portugal, foi um escritor que no início de sua carreira literária participou do movimento neo-realista. Iniciou na literatura com o livro A Cidade das Flores (1959), depois vieram os romances Os Desertores (1960), As Boas Intenções (1963), Enseada Amena (1966), Bolor (1968), Sem Tetos entre Ruinas (1979), O Triunfo da Morte (1981), O Bosque Harmonioso (1982), O único animal que... (1985), Deste modo ou Daquele (1990), Outrora, agora (1996), Nem só mas também (2004 - póstumo). Também produziu um livro de contos intitulado Quatro Paredes Nuas (1972) e três peças de teatro: A Palavra é de Oiro (1961), O Nariz de Cleopatra (1962) e Ode (quase) Marítima (1968).

Autor praticante de vários gêneros, foi principalmente no romance em que Abelaira se sobressaiu. Sua obra mais marcante foi Bolor, romance que marcou uma espécie de ruptura com sua obra anterior. Bolor marca o início de sua fase madura, deixando completamente no passado suas influências neo-realistas e passando a se preocupar com temáticas metafísicas e com formas narrativas mais experimentais. Não é um experimentalismo comum e já produzido na literatura portuguesa até então, mas sim um painel formal rigidamente construido e pensado para, entre outros objetivos, confundir o leitor.

Bolor tem a forma de um diário, e seus capítulos são marcados com dia e mês. Os protagonistas são os próprios (supostos) autores do diário, Humberto, Maria dos Remédios e Aleixo. Os protagonistas formam uma espécie de triângulo amoroso que é, segundo Vilma Arêas ,"misteriosamente" mal resolvido. Esse "mistério" (entre aspas mesmo) que permeia todo o romance, parece ser deixado pelo autor para não ser resolvido, pois segundo o próprio autor do romance, "os mistérios não existem para serem resolvidos; resolvem-se os mistérios com um novo mistério". E assim como não sabe-se claramente o que acontece entre os três "narradores" também não sabe-se quem narra determidados fragmentos, fazendo com que cada um dos protagonistas sejam, se é que todos eles de fato existem, figuras suspeitas.

Segundo Massaud Moisés, "Abelaira põe o homem em questão em face das opções angustiantes oferecidas pela Política, pela Arte e pelo Amor, terminando sempre por apontar, numa lucidez pessimistamente corrosiva, o caos como único resultado possível". Há de se levar em consideração em Bolor a fragmentação da narrativa. A prosa é caótica, como um resultado do próprio caos que permeia a vida tumultuada de seus protagonistas. No livro, significante e significado são elementos que completam um ao outro. A linguagem é reflexo da temática, as ações dos protagonistas são reflexos da narrativa e assim por diante. Nenhum dos elementos distintos (tema e forma) podem ser sobrepostos aos outros em grau de importância, pois "toda essa estilização estética, esse saber fazer, esse aparente culto do novo não impedem e não diluem a reflexão inteligente e interessada a respeito do mundo e da sociedade". (Arêas)

Portanto, Abelaira ao construir um romance novo, ao utilizar uma forma mais intelectualmente articulada, não relega suas temáticas e preocupações a um segundo plano, mas procura deixar um pólo dependente do outro. O que de fato acontece em relação à temática, é que ela muda, ou seja, assume nesse romance proporções mais individualistas, subjetivas. Ao passo em que Abelaira deixa de se preocupar com o coletivo (e há de se levar em consideração a mudança do foco narrativo da terceira para a primeira pessoa), passa a se preocupar com os problemas metafísicos e ontológicos do ser humano.

Os personagens de Bolor se entregam a uma espécie de silêncio opcional, provocando assim uma evidente incomunicabilidade entre eles (incomunicabilidade entre os seres) e com tudo que há ao seu redor. Os personagens se traem, ou seja, traem a si próprios ao negarem ou abandonarem atividades que antes foram essenciais. Humberto claramente não faz mais questão de "participar" de uma sociedade que considera superficial e hipócrita. Provável alusão à desilusão da conquista de uma sociedade democrática, mesmo que o livro tenha sido escrito antes da Revolução dos Cravos. Talvez a visão de Humberto seja uma antecipação do que estava por vir.

O que ocorre com Maria dos Remédios e Aleixo não é diferente, pois ambos abandonam, assim como Humberto, atividades que foram vitais em suas vidas, mas que agora não significam mais nada. Maria dos Remédios é uma cantora que por desencanto canta apenas quando está só. E Aleixo, que troca as artes plásticas pela publicidade, afirma que os artistas não fariam falta alguma à sociedade, "a arte está reduzida a dar beleza aos bem instalados na vida e que os artistas, todos os artistas deviam emudecer, por-se entre parênteses até que o mundo se transforme". Dessa forma Aleixo define a atual condição dos três protagonistas, se incluindo nos artistas que deviam se calar, e assim, nenhum deles pretende mudar o presente e nem têm pretensões de arquitetar um futuro promissor. Como no mito da caverna de Platão, o que os três veem são sombras, e assim querem continuar. Vivem um vitalício simulacro da vida real.

quinta-feira, 10 de setembro de 2009

OS IRMÃOS KARAMÁZOV: ROMANCE-SÍNTESE


Durante os séculos XVII, XVIII e XIX muitos escritores europeus produziram os chamados romances em tomos. Caso de Émile Zola, Honoré de Balzac na França; Laurence Sterne, Jonathan Swift e Charles Dickens no Reino Unido; Eça de Queiroz em Portugal e Nickolai Gogol, Leon Tolstoi e Fiódor Dostoiévski na Rússia. É claro que vários outros autores de outras nacionalidades também publicaram obras grandiosas como os autores citados, mas as citações aqui são de cunho meramente ilustrativo.

A produção de obras em vários tomos era também, além de estilo formal, resultado dos tradicionais folhetins que eram publicados nos jornais, e assim garantiam a permanência e a fidelidade de leitores espalhados por toda a Europa. A receita da forma folhetinesca teve início na França, e em sua gênese o público era em sua maioria feminino e os temas abordados muito leves, pois foi uma criação dos românticos. Mas com o tempo a temática de escritores por toda Europa foi se espandindo e consquistando terrenos mais sérios, com temáticas sombrias, filosóficas e políticas.

O nome mais importante e curioso (talvez por sua conturbada biografia) foi Fiódor Dostoievski (1821 - 1881), russo de Moscou que durante toda sua vida manteve uma atividade literária produtiva e ativa. Sua obra inicial, Gente Pobre e O Duplo (1846), ainda não apresentava o vasto painel social, religioso e filosófico que o autor veio a desenvolver mais tarde em Memória da Casa dos Mortos (1861), Memórias do Subsolo (1864), Crime e Castigo (1866), O Idiota (1868), Os Demônios (1871), O Adolescente (1875) e Os Irmãos Karamázov (1880). Esta última considerada sua obra-prima, ou nas palavras do tradutor Paulo Bezerra, "um romance síntese".

Na composição de Os Irmãos Karamázov, Dostoiévski alcançou a sua plenitude literária tanto na forma quanto na temática. Na verdade, tentar atribuir uma temática à obra seria reduzir seu valor, pois nesse "romance síntese", todas as temáticas que Dostoiévski abordou em suas obras anteriores (de sua fase madura) são abordadas nesse relato sobre a família Karamázov. Os embates religiosos são muito discutidos aqui, tanto sua aceitação quanto sua negação (se Deus não existe tudo é permitido), os embates sociais, que são retratados basicamente entre a relação do patriarca Fiódor Karamázov e seus três filhos, Ivan, Dmitri e Alieksiêi, a corrosão moral da sociedade burguesa, sua derrocada e todas consequências que se mostram, em muitos aspectos, fatais.

O enredo de Os Irmãos Karamázov é até certo ponto banal. Mostra uma família esfacelada por consequência da falta de caráter, inconsequência e lascívia de seu patriarca que, desde tempos imemoriais, relegou o cuidado dos três filhos a um segundo plano. O romance é um painel da sociedade russa da segunda metade do século XIX, e a trama tem início, de fato, após as 400 páginas iniciais, quando o patriarca é misteriosamente assassinado por um dos filhos. Mítia (Dmitri) é levado preso e condenado a trabalhos forçados na Sibéria. Porém, em nenhum momento do romance o verdadeiro culpado é revelado, pois não há provas suficientes contra Mítia (mesmo ele sendo preso e condenado), nem contra Smierdiakov, o filho bastardo de Fiódor Karamázov, que numa das passagens mais interessantes do romance revela todo esquema para assassinar seu amo a Ivan, o primogênito. Mas não sabe-se se a revelação de Smierdiakov de fato ocorreu ou foi tudo fruto da mente confusa e debilitada de Ivan. Esse é outro fato que não se revela, pois no dia do julgamento de Dmitri, Smierdiakov se enforca e leva consigo uma das respostas de todo o mistério. Portanto, como pode-se observar, a trama gira em torno do crime e de seus suspeitos, como um romance filosófico policial. Mas é exatamente no painel que é retratado pelo autor que o romance atinge proporções muito maiores do que parece ter, e também em sua composição formal estilística e linguística.

Até então, o narrador que é anônimo e onisciente, traça o perfil de uma gama imensa de personagens que vêm e vão, conforme sua importância na narrativa. Fiódor Pavlovitch Karamázov era um homem obcecado pelo bem material, deixando inclusive seus próprios filhos passarem necessidades diversas por consequência de sua avareza. Fiódor Karamázov personifica toda uma Rússia que estava aderindo, aos poucos, um sistema capitalista completamente novo em seus domínios, que aqui é descrito pelo autor de forma imoral, insensata e altamente destrutiva.

Nada no romance é deixado à deriva, nada é por acaso. Quem conhece um pouco da biografia de Dostoiévski identifica facilmente muitas passagens de sua vida na leitura do romance. A própria inserção de personagens como Dmitri e Ivan Karamázov tem fundamento na realidade. A relação de Aliocha (Alieksiei) com as crianças é outro fator de extrema importância para a compreensão da narrativa, pois Dostoiévski tinha um apego muito grande pelas crianças, e isso é refletido nesse seu personagem. No posfácio da edição da Editora 34, do tradutor Paulo Bezerra, o tradutor cita Mikhail Bakhtin, que transcrevo aqui:

As personagens literárias são criaturas do mundo real, onde o escritor as pré encontra antes de transformá-las em figuras de ficção (p. 8 - posfácio).

Em muitos casos da literatura, se levarmos em consideração essa passagem de Bakhtin, a personagem real se sobressai à ficção, o que pode ser prejudicial à narrativa. Fato que não ocorre nas obras de Dostoiévski, principalmente em Os Irmãos Karamázov, pois o autor apenas tira as personagens da realidade, mas na composição ficcional, são transformadas, sofrem a metamorfose imposta pelo escritor.

quinta-feira, 7 de maio de 2009

ANGÚSTIAS TRANSMONTANAS


Em 1907, no pequeno vilarejo São Martinho de Anta, ao norte de Portugal, nasce Adolfo Correia da Rocha, que mais tarde, já escritor publicado e médico formado, adotou como pseudônimo Miguel Torga. Torga é considerado um dos grandes escritores portugueses contemporâneos, tendo colaborado, em sua juventude, em diversas revistas literárias, sendo Presença e Manifesto as mais significativas.

Mesmo tendo começado na poesia, e sendo de fato um grande poeta, foi na prosa que Torga obteve mais êxito, principalmente no conto. Em seu primeiro volume de contos, Pão Ázimo (1931), Torga já flertava com temáticas que fizeram parte de sua vasta obra até o fim, como as descrições das angústias do homem transmontano (referente à província de Trás-os-Montes, ao norte de Portugal), como afirma Massaud Moisés:

Porque nela espera
(na terra transmontana) encontrar a explicação para a angustiante condição humana, imediatamente transformada em seu espírito num problema teológico-existencial armado ao redor de indagações-chaves: quem somos? Por que estamos aqui? Qual a razão da existência? E a morte? E Deus?"

Entretanto, é com a publicação de Rua (1942) que Torga atinge um de seus ápices na literatura portuguesa. Nesse volume de contos, Torga assume uma posição artística heterogênea, pois suas temáticas nesse livro vão além dos embates existenciais, e tampouco ficam restritas a um neo-realismo do qual participou, mesmo que com menos afinco e interesse do que muitos outros escritores contemporâneos. Em muitos dos contos presentes em Rua, Torga descreve com rara beleza o embate do indivíduo com a passagem do tempo, a chegada da velhice e condições precárias de sobrevivência (influência neo-realista).

O primeiro conto do volume, Não venha mais..., narra a saga de uma família humilde, na qual o chefe da família, um trabalhador anônimo de uma pequena empresa, é despedido injustamente por um desfalque finaceiro em seu setor. É interessante ressaltar que nesse conto, Torga sutilmente deixa transparecer suas influências neo-realistas, pois o Sr. Varela, o patrão do protagonista anônimo (também um símbolo para o trabalhador em geral), era padrinho de Humberto, o filho mais velho, porém nunca se interessou em se aproximar do afilhado, ou conhecê-lo melhor. Mandava, uma vez ao ano, uma simbólica quantia em dinheiro no dia de seu aniversário, sendo que, após vários anos, o Sr. Varela esqueceu de enviar o dinheiro que sempre enviava, e como se não bastasse, despediu o funcionário de confiança. O final, como é constante em vários outros contos, termina tragicamente, com o suicídio do protagonista.

No conto O Estrela e a mulher, a problemática da passagem do tempo é trabalhada em uma narrativa poética, com nuances metafísicas que se desenvolvem em uma atmosfera urbana. Trata-se de um casal muito conhecido na vizinhança e, juntos, em sua cama, amanhecem mortos. Nesse conto a força e a linguagem do poeta Miguel Torga juntam-se à força narrativa, resultando assim num belo exemplo de prosa poética.

Como de costume, às oito, o sol começou a entrar pelo quarto dentro. Mas já não pôde, à semelhança das mais vezes, descer do peitoril da janela, inundar o soalho, subir à cama, devorar pouco a pouco a colcha branca, incendiar um naco do cobertor vermelho, e acabar por bater-lhes em cheio nas meninas dos olhos. Hoje um e logo a seguir outro, tinham partido. Discretamente, disseram adeus àquelas quatro paredes, voltaram costas à realidade, fecharam-se num recolhimento tão íntimo e tão persistente, que só mesmo no fundo duma sepultura. Deram-lha, então (p.33).

Tantos outros contos do livro são importantes para a análise, como Um dia triste, A Reforma, A Leonor Viajada e Uma luta, porém o texto se estenderia muito. Portanto, seguem as considerações finais sobre o conto Pensão Central, o melhor dos 13 contos que compõem Rua. Em Pensão Central, há uma mudança espacial em relação aos outros contos. A narrativa inicia com Belmiro, único funcionário da Pensão Central, uma antiga pensão que teve um passado esplendoroso, mas que no presente amarga uma total ausência de hóspedes.

D. Teresa, dona da pensão, já conformada com a chegada da velhice e com a falta de fregueses, é a imagem síntese de uma resignação metafísica que assola o ser humano no fim da vida. O fim de seu negócio e consequentemente a escassez de movimento de sua pousada tecem uma linha parelha com o final de sua vida, encerrando dessa forma um ciclo que não mais se estenderá.

Em um movimento narrativo muito bem construído, Torga faz um flashback para explicar a gênese da ruína da Pensão Central. Tudo começou com a chegada de um hóspede misterioso, com hábitos estranhos e nada ortodoxos aos olhos de D. Teresa e dos outros hóspedes. Macedo, um homem que dormia a maior parte do dia, e à noite, é aqui que está a bela sacada de Torga, saía em caminhadas pelas ruas da cidade. Há de se notar aqui a incursão de Torga numa técnica literária muito usada pelos neo-realistas, a narrativa atmosférica. Trata-se de um tipo de narrativa na qual o espaço ( ou algum elemento inanimado, como a noite neste conto, a escuridão), exerce uma influência fundamental na ação do texto, como se o espaço, ou elementos desse espaço, fossem também personagens.

O tom obscuro que é assumido nesse conto e a atmosfera escura e lúgubre são elementos que fazem de Pensão Central um belíssimo conto, levemente ao estilo de Edgar Allan Poe. Interessante aqui é o mistério que fica por solucionar, a atmosfera nonsense que é assumida quando o forasteiro aparece na narrativa e a deixa, como em um fechar de cortinas no teatro. E é por causa desses hábitos estranhos de Macedo que os outros hóspedes vão abandonando a pousada, e dessa maneira a notícia de que um louco é hóspede da Pensão Central, acaba por levar D. Teresa à falência.

O título do livro também remete a algumas considerações. Em sua maioria, os contos de Rua descrevem espaços urbanos nos quais geralmente suas ações se passam em ambientes mais abertos, na rua, como um simulacro da vida real, com todas suas mazelas, prazeres e angústias. Há uma grande gama de figuras típicas das vilas portuguesas, na maior parte anônimos que são designados pela profissão ou função que exercem na sociedade. E assim como esta "rua" serve como sustentáculo real e metafísico, em muitos aspectos também é a ruina do indivíduo.

* Para o leitor que se interessar, Rua foi objeto de estudo da Professora Marcella Lopes Guimarãens, em sua dissertação de mestrado. Sua dissertação foi defendida na UFRJ em 1999, e foi lançada em forma de livro pela Editora Juruá, em 2001. O título do livro é Visões da Cidade: um passeio por Rua de Miguel Torga.



quarta-feira, 22 de abril de 2009

PHILIP ROTH: COMPLEXOS NA DIÁSPORA CONTEMPORÂNEA


Muitos escritores norte-americanos de origem judaica exploraram o chamado humor judaico na ficção, caso de Saul Bellow, Michael Gold e Philip Roth. Este último, talvez o mais significativo escritor americano do século XX ainda vivo, tem uma vasta bibliografia, entre ensaio e ficção. Roth é um praticante (em suas narrativas) do que ele próprio denomina de piada judaica, que está diretamente ligada à culpa, frustração e opressão da figura materna.

No romance O Complexo de Portnoy (1969) Roth cria o kafkiano personagem Alexander Portnoy, advogado com uma latente crise existencial e de identidade. Durante sua confissão ao seu psiquiatra, todo o livro é narrado como uma confissão do paciente Portnoy ao Dr. Spielvogel, Alex, em um monólogo não-linear, escancara toda sua história, desde sua conturbada infância em Newark até a fase madura, em que busca freneticamente encontrar sentido para sua vida. O que não ocorre.

A infância e adolescência de Alex Portnoy são permeadas por situações simbólicas que marcarão o protagonista por toda sua vida. No início do romance, no terceiro capítulo, Alex ainda criança descreve a mãe, Sophie Portnoy, um símbolo da tradicional yiddish mom, numa imagem bem familiar, preparando a refeição quando de repente começa a menstruar, e o sangue escorre pelas pernas e pinga no chão da cozinha. Essa cena provoca uma espécie de efeito catártico em Alex que mais tarde, já na adolescência lembrará.

Está claro que pela casa eu via menos o instrumento sexual dele do que as zonas erógenas dela. E certa vez vi o seu sangue menstrual...vi-o brilhando, escuro, ao meu olhar, no oleado gasto, em frente à pia da cozinha. Apenas duas gotas vermelhas, há mais de um quarto de século, mas que ainda fulguram na imagem dela, dependurada, perpetuamente iluminada, no meu Museu Moderno de Aflições e Ressentimentos.

Esse fragmento, além de descrever a forte impressão que o sangue causa em Alex, também remete ao conceito de Complexo de Édipo, pois Alex, quando criança, era forçado por sua mãe superprotetora a praticar carícias das quais ansiava e ao mesmo tempo queria se desvencilhar. Essa ambiguidade o acompanhará por toda sua vida. Não só nas relações sexuais, mas nos embates que travará consigo próprio em relção à sua identidade. Mais adiante, há um outro fragmento da narrativa de Alex que mostra a relação entre o sangue menstrual de sua mãe com a imagem da carne.

Nessa imagem há também um interminável gotejar de sangue, passando por uma tábua de drenagem, para dentro da panela. É o sangue que ela está drenando da carne, a fim de torná-la kosher e própria para o consumo.

Esse fragmento mostra claramente a alusão que o protagonista faz entre uma imagem de proteção e desejo (sua mãe) e de pecado (o sangue da carne e também o sangue menstrual, que por sua vez, também remete à culpa, pois se há desejo na imagem do sangue, o desejo é por sua mãe). Esse embate vai culminar numa repressão sexual e comportamental que permeará praticamente toda a adolescência de Alex. A prática do insesto, mesmo que imaginário, o levará à prática alucinada e desvairada do onanismo.

Há de se assinalar aqui, que ao passo em que Alex cresce, o complexo de Édipo é substituido pelo insesto. Alex masturba-se em qualquer lugar. No ônibus, na sala de aula, em sua cama, no banheiro. Uma imagem perturbadora e ao mesmo tempo cômica (como uma piada judaica), é Alex se masturbando no único banheiro do apartamento da família Portnoy, com os sutiãns de Hannah, sua irmã. Volta-se aqui, novamente à duplicidade que acompanha o protagonista durante toda sua jornada, ou seja, ora considera sua irmã e toda sua família (simulacro do povo judeu) repugnante; ora a deseja de uma maneira irredutível.

Em um romance como O Complexo de Portnoy, é interessante ressaltar a sua realização linguística, a sua composição narrativa. Neste romance de Roth, a narração é algo claramente assumido por Alex (metalinguagem), mesmo que o objeto livro não apareça em sua narrativa, pois seu relato apresenta-se ao leitor em forma de confissão ao seu psicanalista. E aí está a grande inovação de Roth. Abusa do fluxo de consciência que se faz perfeitamente aceitável e claro nesse seu estratagema: deitado no divã conta toda sua história de maneira completamente confusa e inebriante.

Philip Roth, ao publicar O Complexo de Portnoy em 1969, uma época de total desbunde e inovação cultural nos Estados Unidos, trabalha em dois aspectos principais: a sexualidade e o conservadorismo, em seu caso, a sua conflituosa relação com o judaísmo. Durante toda sua vida considerada adulta, dos 17 anos em diante, Portnoy sente-se rejeitado por sua condição de judeu, principalmente em relação à aparência. Alex, em passagens tragicômicas (tipicamente judaicas), dirige variados e diversos impropérios contra si próprio (como a imagem maior do estereótipo judaico) e contra os judeus, que ao longo do romance, parece uma forma de se auto-firmar como membro atuante de uma sociedade que o rejeita. Porém, todos esses insultos dirigidos aos judeus (e a si próprio), não podem ser levados muito a sério, pois Alex, por sua narrativa ser auto-diegética, não é um narrador muito confiávael.

No final de sua narrativa, ou de sua sessão com o Dr. Spielvogel, Alex deixa algo nas entrelinhas. Talvez o maior símbolo do romance. No último capítulo, intitulado No Exílio, Alex, entre uma relação conturbada e outra, parte para Israel em busca de respostas para perguntas que nem imagina quais sejam. Lá chagando, se envolve com uma componente do Exército Israelense, e a leva para seu quarto de hotel. Entre suas antigas lembranças de infância e adolescência, repletas por muita masturbação e por relações fracassadas, Alex sente que algo estranho está acontecendo consigo, e nessa noite não consegue ter ereção. Parte para mais um encontro, novamente encontra com judeus, que para ele é novidade, um país de judeus (aqui, a diáspora ocorre às avessas, pois há a idéia de fixação geográfica) e novamente, no último lugar em que pensou que fosse possível, descobre-se impotente.

Há aqui uma belíssima imagem, e também aterradora, de seus conceitos, princípios e credos sobre o judaísmo. Talvez esse seja o principal símbolo, a principal metáfora do romance, pois em toda sua vida Alex mostrou-se uma criatura promíscua, sádica e até certo ponto doentia. E também, numa imagem equidistante, sempre negou, ou sempre quis negar sua condição judaica, e apenas em Israel descobriu-se impotente sexual. Portanto, há uma alusão entre esses dois pólos parcialmente distintos, mas que se completam entre si. Assim como Alex Portnoy é incapaz de ter uma ereção (apenas em Israel), também é incapaz de assumir sua identidade. E essa sua revelação vai diretamente ao encontro de suas fobias, denominadas pelo Dr. Spielvogel, por Complexo de Portnoy.






domingo, 29 de março de 2009

Lançamento do meu livro, Abismo

Neste sábado, dia 28 de março de 2009, no Bar Villa Bambu (R. Trajano Reis, 58 - Largo da Ordem), foi realizado o lançamento do meu primeiro livro, Abismo. Foi muito bom contar com a presença de tantos amigos e colegas de trabalho. Agradeço igualmente aos amigos que não puderam comparecer, pois sei que foi por motivos pertinetes e não por falta de interesse. Foi gratificante reencontrar professores da faculdade, como o querido mestre Prof. Jayme, o colega Prof. Ivo, a Profª Raquel e todos o amigos e familiares. Faço questão de manifestar aqui meu afeto e minha gratidão a todos. Grande abraço,

Daniel Osiecki (Curitiba - 29/03/09 - 22:32)

Diana: primeira leitora do livro, namorada e principal ajudante durante o lançamento.

Com o amigo Giuliano. Escritores curitibanos no centro histórico.

Com minha cunhada Thaís, meu irmão André e minha mãe. Grande amigo Alexandre atrás.

Nicole, Thaís, eu, André e Marcelo.

Meu grande amigo, Alexandre, no lançamento do livro.

Com os queridos primos, Nicole e Marcelo.

Com o querido amigo Sérgio.