sexta-feira, 17 de agosto de 2007

Ecos


A luz ainda estava acesa. Ele podia ver por baixo da porta. A luz ainda estava acesa. Naquela casa que dormia seu coração agitado pulsava, era uma espécie de força propulsora que lhe dominava, mas por alguma razão o fazia parar diante da porta fechada. Havia uma batalha terrível com sua própria mão, que ia em direção da porta, mas sempre recuava.

Aquela luz era algum vestígio de esperança? Todas as noites esta pergunta fazia seus olhos arderem e seu corpo se revirar na cama em busca de paz. Os sonhos e os ideais eram agora retratos disformes em preto e branco pendurados em uma parede do porão escuro. Aquele doce som de carícias noturnas eram apenas ecos distantes e soturnos que o angustiavam.

Os passos que vinham do quarto também o inquietavam, talvez fossem piores do que a luz acesa. E se a luz definitivamente se apagasse? E se a luz se apagasse para sempre? Sua caminhada pelo corredor era tensa, seus passos pesados. E se a luz se apagasse? Era tomado por um sentimento de vazio, de extinção, de nada, de nulo. Ela também caminhava dentro do quarto, não dormia. Ambos sabiam da situação e tinham noção de sua gravidade. Bater na porta? Abrir a porta? Cessar a caminhada e apagar a luz? Não havia coragem. A agonia era imensa, era intensa.

Entre um cigarro e outro, imerso na escuridão, pensava em algum modo de chegar a ela, em algum modo de dominar seus sentidos e parar aquela busca sinistra por algo que não sabia o que era. Os ruídos eram difíceis de ouvir, porém quando ouvidos soavam como trovões em tempestades agonizantes. Na caminhada desenfreada através do corredor sombrio suas mãos tremiam.

Ainda podia ouvir os passos que vinham do quarto, sempre com a luz acesa. Ao mesmo tempo em que pareciam vestígios de esperança pareciam também um caminho sem volta. Não havia repouso para suas inquietações.

Caminhou até o fim do corredor e dirigiu-se ao bar. Pegou uma garrafa de gim e preparou uma dose que serviria como um escudo de proteção. No andar de cima as crianças dormiam, o menino e a menina. Não sabiam o que acontecia no andar de baixo. Não sabiam da angústia que se apoderara de todo seu pensamento e nem de suas caminhadas solitárias, noite após noite, pelo corredor mergulhado em trevas.

De repente os passos de dentro do quarto cessaram. Ele tomou todo o gim e com muito cuidado se aproximou da porta. Encostou seu ouvido direito nesta porta que lhe parecia uma muralha surreal e, com um pavor que lhe dominara por inteiro, vagarosamente, com os olhos fechados foi baixando a cabeça para olhar a luz que vinha pela fresta da porta. Havia chegado o momento, pensou.

Abriu os olhos. A luz havia se apagado.

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